Por Joaquim Leitão Júnior[1]e Raphael Zanon da Silva[2]
Entrou em vigor a Lei n° 13.654/2018 que, dentre outras alterações, modificou os artigos 155 e 157 do Código Penal a fim de reprimir com maior gravidade condutas relacionadas à subtração de valores de caixas eletrônicos.
Logo de início, vemos que foi acrescido o parágrafo 4°-A no art. 155, cominando pena maior àquele que empregar substância explosiva, ou análoga, na subtração de coisa alheia móvel causando perigo comum.
Já começou mal o legislador, com todo respeito, pois até então, a conduta de quem subtrai valores de caixa eletrônico com uso de explosivos adequava-se aos crimes de furto qualificado pelo rompimento de obstáculo em concurso com os crimes de dano qualificado (dolo de 2° grau quanto ao estabelecimento atingido) e explosão, podendo a pena chegar a 17 anos. Agora, com esta nova legislação, não vislumbramos mais a possibilidade de ser imputado ao criminoso o crime de explosão em razão da consunção do crime de explosão, agora previsto na nova qualificadora.
O § 7º do art. 155 tornou mais grave o crime de furto quando o objeto sobre o qual recai a conduta for substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego, restando caracterizada novatio legis in pejus. Até então, respondia o criminoso pelo crime de furto simples ou qualificado, com pena máxima de até 08 anos.
Quanto ao crime de roubo, verifica-se que andou mal o legislador ao revogar a causa de aumento genérica relacionada ao emprego de arma. Isto pois, objetivando dar tratamento mais rigoroso, acresceu o § 2°- A aumento em 2/3 a pena daquele que empregar arma de fogo (grifo nosso)na subtração de coisa alheia móvel mediante violência ou grave ameaça, esquecendo da utilização de armas brancas pelos criminosos.
Neste sentir, aquele que utilizar arma branca para a prática do roubo não mais fará jus a incidência de qualquer causa de aumento, responde pelo crime previsto no caput do art. 157 do Código Penal. Logo, em certa parte, estaremos diante de uma novatio legis in melius, devendo retroagir em benefício daqueles condenados pelo crime de roubo com emprego de arma branca.
Poderíamos até acreditar que a nova lei é mais rigorosa, uma vez que o legislador aumentou a pena para o roubo cometido com o emprego de arma de fogo[3]. Todavia, mais uma vez o legislador usa de artifício populista de que trataria de forma mais rigorosa e implacável determinado crime. O legislador ignorou que o poder lesivo de uma arma branca é semelhante ao de uma arma de fogo. Ambas matam, cada uma ao seu modo.
Outro aspecto a ser ressaltado é no que tange a conduta descrita no novo § 3º, inciso II, do art. 157, do CPB. Em nossa compreensão, não perde à índole hedionda, porque apesar da Lei nº 8.072/90 rotular como crime hediondo o “latrocínio”, fazendo, ainda, menção a parte final do antigo §3º, do artigo 157, se percebe uma falha legislativa (não se sabendo se intencional ou de ordem técnica).
Ora, o crime de “latrocínio”, taxado como hediondo, nada mais é do que o roubo seguido de morte, que continua descrito na parte final do novo § 3º, mas, agora, no inciso II. Dentro do sistema legal de hediondez poderão surgir discussões neste ponto, antecipando que em nossa visão houve apenas uma modificação na estrutura do dispositivo, sendo certo que tal alteração não tem aptidão para afastar a hediondez da conduta.
Por fim, no crime do art. 157, § 3°, resolveu o legislador apenar de forma mais grave a conduta que tem como resultado a lesão corporal de natureza grave, restando o crime de latrocínio com a mesma pena anteriormente cominada.
Em arremate, a lei ainda acresceu o art. 2-A na lei que dispõe sobre segurança para estabelecimentos (Lei n° 7.102/83) possibilitando com que as instituições financeiras façam uso de qualquer tipo de tecnologia que impossibilite o uso das cédulas de moeda objeto de crimes relacionados a roubou e furto de caixas eletrônicos.
Veja a Lei na íntegra:
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o Os arts. 155 e 157 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 dezembro de 1940 (Código Penal), passam a vigorar com as seguintes alterações: Ver tópico
“Art. 155. …………………………………………………………..
………………………………………………………………………….
§ 4º-A A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se houver emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum.
…………………………………………………………………………
§ 7º A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego.” (NR)
“Art. 157. …………………………………………………………..
………………………………………………………………………….
§ 2º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade:
I – (revogado);
…………………………………………………………………………
VI – se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego.
§ 2º-A A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços):
I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo;
II – se há destruição ou rompimento de obstáculo mediante o emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum.
§ 3º Se da violência resulta:
I – lesão corporal grave, a pena é de reclusão de 7 (sete) a 18 (dezoito) anos, e multa;
II – morte, a pena é de reclusão de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, e multa.”(NR)
Art. 2º A Lei nº 7.102, de 20 de junho de 1983, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 2º-A: Ver tópico
“Art. 2º-A As instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, que colocarem à disposição do público caixas eletrônicos, são obrigadas a instalar equipamentos que inutilizem as cédulas de moeda corrente depositadas no interior das máquinas em caso de arrombamento, movimento brusco ou alta temperatura.
§ 1º Para cumprimento do disposto no caput deste artigo, as instituições financeiras poderão utilizar-se de qualquer tipo de tecnologia existente para inutilizar as cédulas de moeda corrente depositadas no interior dos seus caixas eletrônicos, tais como:
I – tinta especial colorida;
II – pó químico;
III – ácidos insolventes;
IV – pirotecnia, desde que não coloque em perigo os usuários e funcionários que utilizam os caixas eletrônicos;
V – qualquer outra substância, desde que não coloque em perigo os usuários dos caixas eletrônicos.
§ 2º Será obrigatória a instalação de placa de alerta, que deverá ser afixada de forma visível no caixa eletrônico, bem como na entrada da instituição bancária que possua caixa eletrônico em seu interior, informando a existência do referido dispositivo e seu funcionamento.
§ 3º O descumprimento do disposto acima sujeitará as instituições financeiras infratoras às penalidades previstas no art. 7º desta Lei.
§ 4º As exigências previstas neste artigo poderão ser implantadas pelas instituições financeiras de maneira gradativa, atingindo-se, no mínimo, os seguintes percentuais, a partir da entrada em vigor desta Lei:
I – nos municípios com até 50.000 (cinquenta mil) habitantes, 50% (cinquenta por cento) em nove meses e os outros 50% (cinquenta por cento) em dezoito meses;
II – nos municípios com mais de 50.000 (cinquenta mil) até 500.000 (quinhentos mil) habitantes, 100% (cem por cento) em até vinte e quatro meses;
III – nos municípios com mais de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, 100% (cem por cento) em até trinta e seis meses.” Ver tópico
Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Ver tópico
Art. 4º Revoga-se o inciso I do § 2º do art. 157 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 dezembro de 1940 (Código Penal). Ver tópico (1 documento)
Brasília, 23 de abril de 2018; 197o da Independência e 130o da República.
MICHEL TEMER
Eliseu Padilha
Grace Maria Fernandes Mendonça
Este texto não substitui o publicado no DOU de 24.4.2018
[3]De ressaltar que, nem sempre, armas de fogo são apreendidas e periciadas, existindo uma celeuma jurisprudencial sobre a possibilidade de incidência da majorante respectiva neste ponto. Aliás, existe decisão recentemente do Superior Tribunal de Justiça, suspendendo os processos em que haja discussão a respeito desse tema, até à fixação de tese definitiva pelo STJ que orientará as discussões – dos processos suspensos. Vejamos:
“REsp 1.708.301/MG: RECURSO ESPECIAL. PROPOSTA DE AFETAÇÃO DO PROCESSO AO RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS (RISTJ, ART. 257-C). ROUBO MAJORADO. ART. 157, § 2º, I, DO CÓDIGO PENAL. NECESSIDADE DA APREENSÃO E DA PERÍCIA DA ARMA DE FOGO PARA A INCIDÊNCIA DA MAJORANTE DO ART. 157, § 2º, I, DO CÓDIGO PENAL. AFETADO O RECURSO AO RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS, NOS TERMOS DO ART. 1.036 E SEGUINTES DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL/2015 E DA RESOLUÇÃO STJ N. 8/2008, PARA CONSOLIDAR O ENTENDIMENTO ACERCA DA QUESTÃO JURÍDICA DISPOSTA NOS AUTOS. Afetação deste processo ao rito dos recursos especiais repetitivos, nos termos do art. 1.036 e seguintes do Código de Processo Civil/2015 e da Resolução STJ n. 8/2008, para consolidar o entendimento acerca da seguinte questão jurídica: Se é ou não necessária a apreensão e perícia da arma de fogo para a incidência da majorante do art. 157, § 2º, I, do Código Penal”. – acesso em 25.04.2018 – http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/noticias/Not%C3%ADcias/Suspensas-a%C3%A7%C3%B5es-que-discutem-necessidade-de-per%C3%ADcia-em-arma-para-aumento-da-pena-em-crime-de-roubo. Acesso em 25 de abril de 2018).
[1] Joaquim Leitão Júnior é Delegado de Polícia no Estado de Mato Grosso, atualmente lotado como delegado adjunto da Delegacia Especializada de Roubos e Furtos de Barra do Garças. Ex-assessor do Tribunal de Justiça de Mato Grosso. Pós-graduado em Ciências Penais pela rede de ensino Luiz Flávio Gomes (LFG) em parceria com Universidade de Santa Catarina (UNISUL). Pós-graduado em Gestão Municipal pela Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT e pela Universidade Aberta do Brasil. Curso de Extensão pela Universidade de São Paulo (USP) de Integração de Competências no Desempenho da Atividade Judiciária com Usuários e Dependentes de Drogas. Colunista do site Justiça e Polícia, coautor de obra jurídica e autor de artigos jurídicos.
[2] Raphael Zanon da Silva possui graduação em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2009), pós-graduação em Direito Público pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus (2011) e pós-graduação em Direito Penal pela Escola Paulista de Magistratura-SP (2014). Também é pós-graduado em Direito Processual Penal pela Escola Paulista de Magistratura-SP (2016). Aprovado no exame 140º da OAB, é ex Delegado de Polícia do Estado do Espírito Santo e atualmente é Delegado de Polícia Civil do Estado de São Paulo. Na área acadêmica atuou como Professor de Direito Penal junto à Anhanguera Educacional, e como professor convidado do Curso Complexo Andreucci de Ensino. É professor concursado da Academia da Polícia Civil do Estado de São Paulo.