Quem é autoridade policial? – Justiça & Polícia

Quem é autoridade policial?

Por Gabriel Felipe Lima e Silva

Meu posicionamento sobre o caso:

Apesar do excelente texto, da lógica argumentativa e dos fundamentos usados para corroborar com o posicionamento, continuando o debate presencial, agora estendido para o escrito, ainda mantenho minha posição contrária, também contribuindo com minha singela opinião.

Ao que parece o “X” da questão é o conceito de Autoridade Policial, visto que a lei especial 9.099 em seu art. 69, dispõe:

“A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários.”

Considero que toda a letra de lei, doutrinas e demais fontes do direito são direcionadas a um público técnico – não leigo – com conhecimento de termos e “jargões” com conceitos já definidos. Da leitura de todas, ou no mínimo a maioria esmagadora das doutrinas, como por exemplo Mirabete e Nucci, autoridade policial (dispensando toda a explicação contida nas obras para não tornar o texto prolixo), é a autoridade Judiciária (juiz) e policial (delegado).

Fugindo um pouco do ponto central, acho importante lembrar o ocorrido com as audiências de custódia que retiraram poder da autoridade policial (delegado) e atribuíram ao juiz (autoridade judiciária). No próprio termo de adesão do TJAP (007/2015 – processo 03003/2015) em seu corpo extrai-se: “… em flagrante delito à autoridade judiciária, no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas após sua prisão, …”. Como já falado, é um texto voltado para um público com conhecimento técnico, inexiste a necessidade de se explicar conceitos e, de pronto ao usar o termo “autoridade judicial” só uma figura é o alvo da expressão o JUIZ. Da mesma forma, qualquer termo técnico relacionado à autoridade policial é fazendo referência ao delegado de polícia, caso contrário fosse, poderíamos técnicos e analistas judiciais realizando audiências de custódia.

Com relação ao Enunciado nº 34 do FONAJE (Fórum Nacional de Juizados Especiais): “atendidas as peculiaridades locais, o termo circunstanciado poderá ser lavrado pela Polícia Civil ou Militar”.

Ressalta-se que é uma ação de exceção, de extrema necessidade, contrariando o posicionalmente do TJAP ao adotar o procedimento para a Capital de um Estado, onde em tese tem-se a melhor estrutura. Muito mais lógico me parece, seria atribuir o poder de lavrar TC’s aos Agentes da Polícia e/ou Oficiais da Policias Civil, levando em consideração as peculiaridades da região. No presente caso, as constantes ausências dos delegados no momento das ocorrências. 

Em rápida pesquisa ao texto do Código de Processo Penal, é possível identificar o uso reiterado da expressão “autoridade policial” em ao menos 45 oportunidades para se referir de modo inequívoco à figura do Delegado de Polícia. Observa-se também que de maneira sistemática essa expressão é utilizada nas mais diversas normas do ordenamento jurídico brasileiro sempre quando se quer fazer referência específica ao cargo de Delegado de Polícia. Somando-se a isso, a Lei n. 12.830/13, em seu artigo 2, parágrafo 1°, define que: “ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei”.

Nesse sentido, não haveria razão para se perscrutar qual a intenção do legislador ao utilizar a expressão “autoridade policial” no texto da Lei n. 9.099/95. Ora, se a expressão adotada foi precisamente aquela utilizada outras tantas vezes para se referir a Delegado de Polícia nas mais diversas normas do Direito Brasileiro, fica claro que a intenção do legislador não poderia ser outra. Caso contrário o legislador adotaria outra expressão que não “autoridade policial”, optando-se por agente do estado, ou qualquer outra mais abrangente, por exemplo. 

Não obstante, ainda que fosse o caso, seria incorreto estender o seu alcance aos policiais militares, uma vez que a investigação é a atividade fim da Polícia Judiciária, detentora dos poderes e prerrogativas da condução de investigações. Assim, por se tratar de um meio de investigação, ainda que mais simplificado, o Termo Circunstanciado deveria ficar a cargo da polícia investigativa, nesse caso conduzido particularmente por Escrivães e Oficiais de Polícia Civil, jamais devendo alcançar praças do policiamento ostensivo.

Levanto a questão de que o policial militar é um agente parcial, e não poderia ser diferente, é um agente estatal que lida com situações de risco a cada segundo de trabalho, pondo a própria vida em perigo de morte, assim, é inimaginável cobrar uma conduta imparcial e amena, essencial para lavrar um TC, sem deixar que suas emoções interfiram no procedimento.

Nesse sentido, não posso deixar de mencionar que a decisão de lavrar ou não um TC é uma deliberação que compete a um Agente do mais alto grau de capacidade técnica, no caso o delegado; como exemplo uso algo corriqueiro do cotidiano em que a maioria esmagadora das ocorrências levadas a Autoridade Policial sobre o argumento de desacato a autoridade são desconsideradas pelo delegado, que tem um grau técnico e sabe quando de fato o ocorrido se enquadra no tipo penal e esse mesmo conhecimento técnico elevado não pode ser cobrado da Policia Militar, que tem sua função constitucional de polícia ostensiva e a preservação da ordem pública (art. 144, §5º da CF).

Por fim, se fala em defesa do ato do TJAP que o TC é um procedimento simples e de “menor importância”, em concordância com a Lei 9.099 que é regido pelos Princípios da Simplicidade, Celeridade e Informalidade, contudo, esquecem os efeitos finais de uma sentença desse procedimento especial que é o mesmo de qualquer outro procedimento, seja: comum, ordinário ou sumário. Com o ato do TJAP, poderá ser lavrado por um agente sem o devido conhecimento técnico, gerando no futuro para o acusado uma condenação indevida, nascida de uma TC que sequer devia existir, gerando todos os efeitos de uma condenação penal a pessoa.

Gabriel Felipe Lima e Silva é advogado.


1 comentário em “Quem é autoridade policial?

  • Concordo quanto ao conceito de Autoridade Policial, também vejo que infelizmente o TJAP ao autorizar a lavratura de TC por Policiais Militares fez de forma muito simples, descuidando de situações práticas quanto a atribuição, soluções em casos de conflitos, no caso de duplicidade o que sera considerado, ou seja, uma infinidade de circunstancias sem a devida regulamentação. Por fim, concordo que o TC deve seguir seus princípios da informalidade, simplicidade e agilidade, porém não pode fechar os olhos a legalidade, o que por vezes há confusão entre resolver o problema com se livrar do problema. Parabenizo o Dr. Gabriel pela contribuição ao debate.

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